Conversamos
rapidamente com Ana Elisa Ribeiro (40, mãe, professora, escritora, poeta,
mestre e doutora em Linguística, semifinalista do prêmio Portugal Telecom 2014 com o livro
Anzol de Pescar Infernos, publicado pela Editora Patuá e, -a meu ver, dos
títulos mais bem concebidos da poesia atual, juntamente com Um Útero é do
Tamanho de um Punho da Angélica Freitas e A Solidão é um Deus Bêbado Dando Ré
Num Trator do Diego Moraes-. No mesmo ano, Elisa teve o livro de crônicas Meus Segredos com Capitu, publicado pela Jovens Escribas, de Natal, semifinalista no mesmo prêmio) sobre a coleção Leve Um Livro, projeto literário
que reúne autores da poesia contemporânea brasileira e, querendo ou não, mostra
um raio-x do que tem sido produzido atualmente nesse nicho.
Basicamente
o projeto resume-se a convidar 24 poetas de todo o país para publicarem
microantologias feitas exclusivamente, inclusive projeto gráfico, para o Leve
Um Livro. Cada obra tem uma tiragem de 2500 exemplares que são distribuídos
gratuitamente em 20 pontos de Belo Horizonte em Minas Gerais, ou seja, quem
possuir interesse em adquirir um ou mais livros da coleção, basta passar em um
dos 20 pontos e levar um exemplar. Poesia de graça, 0800, como nunca se viu no
Brasil.
O
papo ligeiro com Ana foi mais no sentido de entender o surgimento da ideia,
como foi possível pô-la em prática, quais autores convidados, retorno do
público, receptividade e tudo mais.
01 - Quantos autores
participam do projeto Leve um livro?
São
24 autores por ano, isto é, dois por mês, sempre um de Minas Gerais ou belo-horizontino e outro de fora do Estado. Já fizemos os 24 da primeira temporada
(2015) e estamos nos quatro primeiros da segunda temporada (2016). Ainda
haverá, se tudo der certo, uma terceira temporada (2017), com mais 24
escritores. Quem são já é mais difícil porque não sei de cor, mas você pode
espiar no site: www.leveumlivro.com.br.
Lá tem tudo, inclusive para download.
02 - Há quanto tempo o
projeto está acontecendo?
Para
o público, desde dezembro de 2014. Para nós, que o produzimos, submetemos,
executamos, tem muito mais tempo. Então já temos aí mais de um ano de
realização, mas pensando e produzindo temos uns quatro.
03 - Gostaria de saber
do feedback que vocês estão tendo também tanto na internet como nos pontos onde
os livros são deixados.
O
feedback é muito positivo, muito legal mesmo. É isso o que nos anima, porque a
trabalheira é insana. Da internet temos o retorno mais perceptível. As pessoas
postam fotos no Instagram e nos marcam, então vemos colecionadores, pessoas que
pegam livros, que ganham, que enviam para outras. Esse “tráfico” é muito bacana
pra nós. Também somos constantemente visitados na página da coleção no
Facebook. Enviam-nos mensagens, perguntam sobre como participar da coleção,
onde pegar livros, se não estenderemos o projeto a outras cidades, estados,
países. Isso nos diz muito sobre a recepção do projeto. Também nos elogiam,
abertamente. Já nos pontos é mais difícil de saber, pois não ficamos lá para
monitorar a recepção. Seria legal. Seria legal filmar, inclusive. Mas sempre
perguntamos às pessoas que trabalham nos pontos e veem o que rola. São garçons,
recepcionistas, porteiros, gerentes, caixas… depende de onde cada espaço coloca
o display e os livros. E eles dizem que as pessoas procuram, pegam, colecionam,
telefonam para saber se já chegou o autor do mês, pedem mais. Na virada de uma
temporada para a outra, renegociamos cada ponto, isto é, perguntamos se queriam
continuar. 70% quiseram, com alegria indisfarçável. Os que não quiseram nem
tiveram opção. Foram pontos que nós achamos melhor retirar ou pontos que
mudaram de dono, fecharam etc. Aprendemos muito com isso. Nossa negociação
atual prevê alguns pontos bem legais. Bom, mas deve acontecer de alguém não
curtir. Nós é que não ficamos sabendo.
04 - Como que funciona
realmente essa parte, como tem sido a experiência?
Por
uma coleção assim para funcionar dá bastante trabalho. Depois de obter os textos,
diagramá-los (o projeto gráfico é do Bruno Brum e as ilustrações são da Tatiana
Perdigão. O site é trabalho do Mozart Brum), revisá-los e imprimir os livros, nosso produtor e distribuidor, o
Rafael, sai pela cidade com os livros e abastece os 20 displays dos espaços que
nos acolhem. É uma semana só andando. A experiência geral é sensacional. A
gente se ressente, às vezes, de falta de grana, de apoio, de compreensão, de
divulgação até, mas esta vivência de edição, distribuição de livros de
literatura viva e a recepção de quem curte e aprende com a coleção é
inestimável.
Dos
autores já publicados temos,
1º Temporada: Amarildo Anzolin, Ana Elisa/Bruno
Brum, Ana Martins Marques, Caio Carmacho, Carlos Ávila, Chacal, Douglas
Diegues, Fabiano Calixto, Fabrício Marques, Jovino Machado, Leo Gonçalves, Luiz
Roberto Guedes, Makely Ka, Marcello Sahea, Marcelo Dolabela, Marcelo
Montenegro, Maria Rezende, Mônica de Aquino, Nicolas Behr, Paulo Scott, Renato
Negrão, Reuben da Cunha Rocha, Simone Andrade Neves, Thaís Guimarães.
2º Temporada: Ademir Assunção, Adriane Garcia,
Allan Jones, Amanda Bruno, Ana Caetano, Anízio Vianna, Bruna Beber, Bruna
Piantino, Chico de Paula, Daniel Minchoni, Diego Moraes, Fabrício Corsaletti,
Francesco Napoli, Ismar Tirelli Neto, Joca Reiners Terron, Juliana Bernardo,
Júlio Abreu, Kiko Ferreira, Letícia Féres, Líria Porto, Luana Vignon, Mariana
Botelho, Sergio Mello, Tazio Zambi.
E
aí, quais dos escritores acima que vocês conhecem? Se alguém que tiver lendo
esse texto e quiser, de repente, resenhar os livros da coleção e mandar pro
Diretório Literário, só ir em nosso inbox no facebook que super rola.
Ao
final do projeto, se rolar também em 2017, o Leve Um Livro terá publicado 72
escritores brasileiros, imaginemos agora cada estado do país imprimindo 2500
exemplares de 24 obras diferentes por três anos consecutivos para distribuir
gratuitamente. Por ano dá 60 mil livros impressos, em três anos teríamos a
cifra de 180 mil exemplares distribuidos e se multiplicarmos 180 mil por 26
estados mais o distrito federal dá igual a 4680000 (quatro milhões, seiscentos
e oitenta mil livros), meldelsdocel, buguei com tanto livro, mas amém, né.
Enfim,
retornando à realidade, diferente da antologia 26 Poetas Hoje, organizado pela
Heloisa Buarque de Hollanda, como o próprio nome sugere, antologia, a coleção
idealizada pela Ana Elisa e Bruno Brum mostra que “[...] a participação do autor nas
diversas etapas da produção e distribuição do livro determina, sem dúvida, um
produto gráfico integrado, de imagem pessoalizada, o que sugere e ativa uma
situação mais próxima do diálogo do que a oferecida comumente”, como cita
Heloisa no introito da antologia.
O
que quero dizer é que é cada vez mais comum autores/editores no meio literário,
as pequenas editoras que o digam, Patuá, Penalux, Kazuá. Se cada autor da
geração mimeógrafo produzia o próprio livro, hoje um autor produz obras de
vários autores, novos, falecidos, premiados etc. A apropriação dos meios de
produção do livro é algo que está sendo superado, superar a barreira entre obra
e público é que é o bicho, daí a importância de projeto como o Leve Um Livro,
cuja finalidade é, digamos, pescar leitores e formar público por tabela.
Muito boa a entrevista sobre o Leve um Livro e muito legal poder com isso conhecer o site.
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